Foi em 1969, às vésperas do aniversário de 250 anos da capital mato-grossense, um dos acontecimentos políticos mais ‘polêmicos’ de Cuiabá: sob a ditadura militar, com eleições indiretas para o cargo máximo do município, a cidade ficou dias com dois prefeitos, um indicado pelo governador, e outro pela Câmara Municipal.
A história começou quando o governador Pedro Pedrossia demitiu o prefeito Frederico Carlos Soares de Campos, na época, por possíveis irregularidades financeiras oriundas de qualidade e prazo na execução do calçamento das ruas do centro da cidade. Logo depois, Pedrossian nomeou o engenheiro-agrônomo Bento Machado Lobo, causando grande desconforto no meio político e na população, que bem avaliava a administração municipal.
Os vereadores de Cuiabá, tão logo tomaram conhecimento da nomeação de Bento Lobo no dia 12 de fevereiro, se negaram a receber os documentos e reconhecer o novo nomeado para a posse.
Oito dias depois, em 20 de fevereiro, os vereadores foram convocados pelo novo presidente da Câmara, o advogado Valdevino Ferreira de Amorim, para comparecerem na manhã do dia seguinte a uma sessão extraordinária, para discutir aquela situação embaraçosa e tomar as providências cabíveis.
Sabia-se que, por lei, a nomeação de Bento Lobo só valeria após a ratificação do ato pela Assembleia Legislativa do Estado. No entanto, o parlamento estadual estava em recesso, o que tornava impossível a ratificação da indicação de Bento Lobo e consequentemente a sua posse.
Outro erro teria sido nomear um novo prefeito antes da publicação oficial da exoneração do desafeto do Governador. Por fim, era a Câmara quem dava posse ao prefeito, e ela era de maioria da Arena, partido do presidente Valdevino de Amorim, indisposto a aceitar a vontade do Governador.
O Presidente da Câmara não reconheceu a nomeação de Bento Lobo. Disse que não se tratava de uma luta pelo poder, mas sim de cumprimento legal e respeito ao poder legislativo. Sendo assim, resolveu recorrer à Justiça.
Temendo a demora e indefinição de uma sentença judicial, Valdevido de Amorim – então presidente da Câmara – levou toda a sua bancada para aquela sessão extraordinária e expôs o transtorno político que adveio com a nomeação de um novo prefeito. Invocando os ditames legais, tomou posse como prefeito de Cuiabá.
A cidade, a partir de então, passava a contar com dois prefeitos, um nomeado pelo Governador e o outro pelos vereadores arenistas, sob protestos da oposição (MDB), com certo clima de tensão, inclusive de possível intervenção de Brasília.
Valdevino de Amorim comunicou à imprensa, ao governador e ao povo que ele era o novo prefeito municipal. Entretanto, não houve qualquer medida administrativa efetiva do autodenominado prefeito constitucional à frente do Executivo municipal.
Da mesma forma, Bento Lobo não demonstrava um efetivo comando do executivo, e por poucas vezes foi à sede da prefeitura. A indefinição preocupava a população, receosa do destino da cidade no ano do seu significativo aniversário.
As atenções voltaram-se para a Assembleia Legislativa, que voltaria do recesso só no dia 15 de março, e o seu presidente não demonstrava a intenção de convocar os deputados antes dessa data.
Enquanto isso fervilhavam debates no meio político e popular. De um lado, a legalidade dava respaldo à atitude do vereador Valdevino de Amorim, de outro, a certeza de que Bento Lobo seria acreditado pela Assembleia, recomendava uma posse antecipada.
Depois que a Assembleia foi reaberta, sua Comissão de Constituição e Justiça acolheu por 5 a 2 votos a indicação do Governador. Finalmente, no dia 24 de março, poucos dias antes do aniversário da capital, em meio a acalorados discursos e protestos nas galerias da Assembleia Legislativa, já no tardar da noite, os deputados estaduais referendaram Bento Lobo como o novo prefeito da capital.
Bento Machado Lobo foi até à Câmara no dia 27 de março para ser empossado. Já o vereador Valdevino de Amorim renunciou ao seu mandato de vereador no dia anterior, sentindo-se de certa forma traído pelos outros Edis, voltando a dedicar-se à advocacia.
Foi assim, de forma tumultuada, após uma atitude insensata e despótica do Governador, que os cuiabanos quase ficaram sem uma mão para cortar o bolo dos 250 anos da cidade.
Fonte: Olhar Conceito