Rodrigo*, estudante de 28 anos, não imaginava que seria obrigado a transar sem preservativo quando, em um sábado, marcou encontro com um homem que conheceu em um aplicativo de relacionamentos. Assustado, ele não teve condições de impedir que o desconhecido cometesse o abuso. O sexo anal desprotegido é um dos principais meios de contaminação do HIV. Rodrigo, contudo, faz parte da população-chave que pode tomar a chamada PEP (Profilaxia Pós-Exposição), uma combinação de medicamentos antiretrovirais que podem coibir a contaminação e proliferação do HIV.
Para funcionar, a profilaxia deve ser iniciada logo após a exposição de risco, em até 72 horas, e deve ser tomada por 28 dias. Ela é recomendada para situações de violência sexual, relação sexual desprotegida e acidente ocupacional.
Em Cuiabá, a PEP está disponível no Serviço de Atendimento Especializado (SAE), policlínicas e está em processo de implantação nas Unidades de Pronto Atendimento (Upas). Conforme assegurou a coordenadora do SAE, Kamylla Reis, não existe nenhum caso registrado de alguém que tenha contraído o vírus HIV depois de tomar a profilaxia. “Nesses casos a pessoa vem até a unidade de saúde, passa pelo atendimento conjunto com a enfermagem e psicologia, faz a avaliação de risco. Se ela tem a indicação, ela já passa pelo médico e na mesma hora já sai de lá com o medicamento. O único exame que a gente faz é o teste rápido, porque a gente precisa saber se ela não tinha HIV antes daquela exposição”, explicou.
De janeiro a setembro de 2019 foram registrados 394 novos casos de pessoas soropositivas somente em Cuiabá. Os dados englobam os casos atendidos pelo SAE. É um aumento significativo se comparado a 2018, que registrou 443 casos em todo o ano.
Há a estimativa, contudo, de que para cada pessoa que sabe sobre a sua doença, existem outras 4 que não têm conhecimento de que são soropositivas. Dentro dessa perspectiva, existem pelo menos 1,5 mil novos casos por ano na Capital. “Mas ainda não foram computados os dados de final de ano, em que a galera bebe muito. Então esses números ficam cada vez mais assustadores. Esse número é só no Sae. Então se você imaginar o resto da rede, além dos que nunca fizeram o teste e não sabem de sua sorologia”, complementou a especialista.
Desde março, a rede municipal de saúde oferece a profilaxia de pré-exposição (Prep), medicamento preventivo que pode ser tomado de maneira contínua por pessoas que têm alto risco de contrair o HIV. Gays, homens que fazem sexo com outros homens, pessoas trans, trabalhadores do sexo e pessoas que têm parceiro soropositivo estão dentro dos grupo de risco. “A pessoa faz o agendamento, passa por uma triagem com a psicologia para saber se tem realmente há necessidade de tomar, quais são suas motivações. Depois que a psicologia fez esse primeiro acolhimento, a enfermagem faz a avaliação de risco e se a pessoa for elegível para a Prep ela é encaminhada para o médico, que faz o pedido de exames de sangue”, explicou Kamylla.
Por ser um antirretroviral, a medicação pode ter efeitos colaterais como náuseas, vômito, mal-estar e diarréia. Pessoas com problemas no fígado ou no rim não são orientadas a tomar a medicação, que pode comprometer estes órgãos. Por isso, o profissional deve exigir exames de sangue e a inserção da Prep deve ser acompanhada pelo período de 90 dias. “Depois de saber se está tudo bem no exame de sangue a gente faz a prescrição para 30, 60 e 90 dias. Então a primeira vez a gente libera 30. Você toma e volta. A gente faz uma nova avaliação para ver se teve algum evento adverso, se surgiu algo, se você entrou em risco novamente ou contraiu o HIV de alguma forma. Se você for elegível a gente aumenta para 60 e depois para 90”.
A partir de 7 dias, a pessoa que toma Prep está segura para praticar sexo anal e somente a partir de 28 dias pode praticar sexo vaginal. Conforme salientou Kamylla, contudo, a medicação não protege contra outras doenças sexualmente transmissíveis como a sífilis, a clamídia e a gonorréia. “Existem as pessoas que acham que porque estão tomando a Prep podem parar de usar a camisinha. Se você tem um parceiro fixo e uma relação de confiança e acredita que não tem nenhum risco de contrair nenhuma doença, tudo bem. Isso é a autonomia do usuário de escolher. Mas se você tem múltiplos parceiros que você não conhece a sorologia deles, você corre risco”, finalizou a coordenadora.
Toda a rede de saúde municipal de Cuiabá fornece testes para diagnóstico de HIV, sífilis e hepatites B e C. Por meio da coleta de sangue ou fluido oral, o resultado fica pronto em minutos. O teste rápido deve ser feito com regularidade e sempre que você tiver passado por uma situação de risco, como ter feito sexo sem camisinha.
Fonte: Folhamax