Após 300 anos, Porto de Cuiabá segue em eterna transformação

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Considerado um dos bairros mais importantes para o desenvolvimento de Cuiabá, o Porto – oficialmente fundado por volta de 1721 – guarda parte significativa dos 300 anos de história da capital mato-grossense. Ali, reformas na Orla do Rio Cuiabá e em seu entorno visam o avanço da economia e do turismo na região e permeiam o tricentenário da cidade.

Mas assim como demais obras que compõem o pacote em alusão à data, a região ainda é assombrada pelo “fantasma” do Veículo Leve Sob Trilhos (VLT), exemplo de projeto que mexeu com toda a cidade na Copa do Mundo de 2014, mas nunca saiu do papel.

A região, marcada pelo comércio e pela expressão da cultura popular, está interligada com a fundação das Minas do Cuiabá e sua elevação ao Arraial de Bom Jesus de Cuiabá, em 1827. Por ali se fixaram as primeiras pensões e hotéis. No antigo ponto de carga e descarga de mercadorias e de comunicação, o comércio se estabeleceu, época em que o rio Cuiabá era a única rota disponível.

“Se o rio foi caminho para o início da exploração e da colonização, foi no Porto que se estabeleceram os pontos de entrada e saída, de carga e descarga e de recepções e despedidas. Ali se fixaram as residências dos antigos monçoeiros da elite cuiabana, um tipo de bandeirantes que seguiam a rota das monções, desciam o curso dos rios em direção ao oeste na estação mais seca e voltavam quando o nível da água estava mais alta”, como consta em reportagem especial da Prefeitura de Cuiabá.

Após a conclusão da primeira etapa da esperada Orla do Porto, os principais equipamentos da região ainda seguem reféns das incertezas e do abandono. Inaugurado em 2016, o complexo turístico – uma extensão da ponte Júlio Muller até o antigo Cais portuário, na Avenida Manoel José de Arruda – se tornou um centro de eventos, movimentando a região com shows, feiras e celebrações como o réveillon e carnaval.

Assim como a Orla, que terá continuação com o projeto “Orla do Porto II”, o Aquário Municipal, Mercado e Cais do Porto esperam por reformas, manutenções e revitalizações que buscam resguardar história e funcionalidade da região pioneira. Os projetos, no entanto, ainda não foram colocados em prática.


Obras na Orla do Porto II e Cais do Porto deveriam começar há um mês e finalizar ainda este ano, mas ainda estão paradas (Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

Continuação da Orla do Porto

Uma ordem de serviço para a construção da segunda etapa da Orla do Porto foi assinada em fevereiro deste ano. Segundo a Prefeitura de Cuiabá, os trabalhos deveriam começar no dia 25 e terminar em seis meses. O secretário de Obras Públicas de Cuiabá, Vanderlúcio Rodrigues da Silva, diz que a empresa Geosolo está trabalhando em terraplanagem.

A obra é realizada pela empresa X Nova Fronteira, com investimento de R$ 3.769.959,31, recurso oriundo do Ministério do Turismo que já estava parado na conta há mais de sete anos.

O projeto Orla do Porto II prevê a construção de calçadões para caminhada e contemplação, além de uma ciclovia bidirecional, com a intenção de se conectar com a Orla do Porto I. De acordo com o município, uma área coberta de lonas tensionadas será edificada para feiras e programação cultural, bem como um espaço de aparelhos para atividades físicas ao ar livre, estacionamento.

O projeto também prevê a recuperação das margens do rio, iluminação, mobiliário urbano, arborização, adequação de acessibilidade e instalação de esculturas com personalidades regionais ao longo da via.

Novo Cais do Porto

O primeiro Cais do Porto, construído no século 19 por ordem do almirante Augusto João Manoel Leverger, o “Barão de Melgaço“, é outra estrutura que, subutilizada, deverá ser retomada no pacote de obras dos aniversário de 300 anos. O novo Cais, por sua vez, será construído pela empresa Geosolo Engenharia por R$ 2.416.756,96, recurso também federal.

Desativada há anos, a estrutura está no fim da Avenida XV de Novembro, próxima à instalação da Marinha, onde atualmente é a Praça Luís de Albuquerque. Terceira etapa do complexo da Orla, a ordem de serviço foi assinada no dia 20 de fevereiro. Os trabalhos deveriam começar cinco dias depois, junto à revitalização da Orla do Porto II, com prazo de 270 dias, mas a obra está parada. De acordo com Vanderlúcio Rodrigues, a empresa está trabalhando em fase de mobilização.

O local deve ganhar uma área de lazer e de contemplação da natureza, com anfiteatro, elevador panorâmico, mirante e restaurante. A mega estrutura seria composta por três níveis, sendo um mirante no piso superior e um deck no inferior. O projeto prevê pavimento térreo, área de convívio com dois ambientes para atividades culturais, bem como área de suporte administrativo, copa e sanitários.


Novo cartão postal da cidade, Orla do Porto e Vila Cuiabana estão marcadas por rachaduras (Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

Orla I “ainda a desejar”

Antes de chegar ao pátio de obra da segunda etapa da Orla do Porto, a reportagem do LIVRE esteve na Orla do Porto I e encontrou muitas rachaduras no piso, uma das irregularidades que já vem chamando atenção do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-MT) desde 2017. Encontrou também reclamações de comerciantes sobre a infraestrutura do local, que ainda sofre com problemas na iluminação.

De acordo com o gerente de um dos restaurantes do local, apenas os comerciantes acabam arcando com a manutenção dos pontos. Segundo ele, a empreiteira responsável pela obra chegou a realizar um levantamento dos defeitos no local no mês passado, mas nada foi feito até o momento.

A Prefeitura de Cuiabá, responsável pela administração da Orla, informou, no entanto, que recebe a demanda de manutenção e executa por meio da Secretaria de Serviços Urbanos.

O professor universitário Euziclei Gonzaga, 33 anos, visitava o local pela primeira vez, contemplando a “Vila Cuiabana”, réplica das casinhas coloridas que guarda a história do Porto, tornando-se cartão portal da região. Pai de criança e avô, ele percebe o estigma da insegurança no local.

“Parece um espaço muito bom, mas não usufruo, até porque moro mais distante, próximo à UFMT. Eu uso mais os parques, como o Tia Nair, Parque das Águas e, às vezes, o Mãe Bonifácia. Também vejo que aqui é um espaço marginalizado e muita gente ainda tem receio. Então deixa a desejar. Eu não me arriscaria a vir aqui com a minha família à noite, por exemplo”, afirma o servidor público.


Comerciantes do Mercado do Porto esperam por ampliação e melhorias há 10 anos (Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

Mercado do Porto e o “fantasma do VLT”

Comerciantes do Mercado do Porto, alguns no local desde sua fundação, são categóricos ao afirmar estão perdendo as esperanças de que a demanda pela melhoria de infraestrutura seja atendida. Eles dizem não receber informações sobre a possível reforma do local. “A empresa que ganhou a licitação é a mesma do VLT?”, questionam os comerciantes, que comparam a situação do local à obras da Copa que nunca saiu do papel.

Um processo de licitação para a obra foi aberto em setembro de 2018. A promessa da Prefeitura de Cuiabá era de que o projeto de reforma e ampliação do mercado varejista “Antônio Moisés Nadaf”, localizado às margens do córrego Oito de Abril, saísse do papel com prazo de conclusão de 12 meses.

De acordo com o secretário de Obras Públicas, a vencedora da licitação, finalizada há cerca de 20 dias, foi a empresa Lotufo Engenharia e Construções. “Nós daremos ordem de serviço talvez neste sábado, mas já estamos agendando”, afirmou.

Sobre a “demora” no processo, a alegação é de que as empresas têm um período para entrar com recursos, mas que o cronograma está dentro do prazo. “Nós já reunimos com a associação e antes da obra ser iniciada, a empresa vai passar um cronograma do que será feito”, disse Vanderlúcio Rodrigues. Segundo o secretário, a obra deve ser finalizada em 8 meses.

Mariele, 52 anos, também reclama que, com a espera pela obra, os comerciantes não conseguem realizar reformas em seus pontos por conta própria. “A gente não pode arrumar, porque tem que esperar a obra que nunca vem. Dizem que já ganharam a licitação, mas a empresa nunca aparece. Aqui dava pra vir um arquiteto orientar a gente, arrumar esses ventiladores e telhas. Olha a diferença de claridade de uma telha limpa. Não é coisa de outro mundo. Uma hora alguém vai encher o saco e querer fechar isso aqui”, ressalta.

De acordo com o projeto do novo Mercado do Porto, a estrutura que hoje ocupa uma área de 26.480 metros da área do “Campo do Bode”, deverá ter seu espaço ampliado em quase 6,8 mil m². A reforma orçada em R$ 14,1 milhões prevê novas instalações hidráulicas e elétricas, aumento do número de vagas de estacionamento com espaços específicos para motocicletas, ciclistas, carga e descarga e até mesmo ônibus turísticos, além de “melhorias urbanísticas”.

Inaugurado em 1995, o Mercado do Porto abriga açougue, aves, peixes de todos os tipos, além de hortifrutigranjeiros, assim como lanchonetes e restaurantes.

Aquário Municipal

Inaugurado em 2000, o Aquário Municipal de Cuiabá, que recebeu o nome de Justino Malheiros, permaneceu em funcionamento até 2009, quando foi fechado para reforma. Em razão da Copa do Mundo de 2014, teve nova obra anunciada, à época pelo então prefeito Mauro Mendes, com previsão de R$ 4 milhões de investimento. Como tantas outras, não foi finalizada e teve o prazo ultrapassado.

À época, a informação era de que o espaço já estava quase pronto para voltar ao funcionamento, faltando parte do acabamento e a instalação de vidros especiais para os tanques, onde devem ficar expostas várias espécies de peixes dos rios mato-grossenses.

Com a nova gestão da Prefeitura, uma nova data foi repassada. O espaço, que era mais uma opção de lazer na Capital, foi prometido para o mês o aniversário de Cuiabá, em abril deste ano. No entanto, deverá seguir com as portas fechadas. Em julho do ano passado, a Prefeitura tornou a informar que faria a licitação para a instalação dos vidros no local. Pouco depois, informou que não houve interessados.

Fonte: O Livre