Dentre todas as incertezas – sejam de natureza administrativa, sejam de caráter financeiro – que o próximo prefeito de Cuiabá terá ao se sentar em sua cadeira no 7º Andar do Palácio Alencastro, uma que certamente vai acompanhá-lo durante toda a gestão é a da obra do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT).
A polêmica obra do governo do Estado, que já acarretou interferências nas gestões municipais de Wilson Santos (PSDB), Chico Galindo (PTB) e Mauro Mendes (PSB), não tem data para reiniciar e muito menos para ser concluída. À espera do VLT, nenhum dos três últimos prefeitos pôde fazer a licitação do transporte coletivo ou solucionar o problema de congestionamentos nas principais artérias da Capital.
Apontado como a solução para o transporte coletivo de Cuiabá – e muitas vezes como desculpa para que nada melhore -, o VLT está nas propostas de todos os seis candidatos à prefeitura neste ano.
Todos eles são a favor da continuidade da obra e prometem pressionar o governo estadual para que isso aconteça. Diferentemente dos demais candidatos, porém, Emanuel Pinheiro (PMDB) afirma que o município pode colocar recursos na obra, de modo a ajudar o Estado, que está em crise financeira.
“Sabemos que o VLT é uma responsabilidade direta do governo do Estado, mas as obras estão atravessando as vias da capital, sangrando-as. Por esta razão, vamos participar ativamente do processo, não administrativamente por não ser competência da prefeitura, mas como parceiros e cobradores das ações”, afirmou.
O candidato Renato Santanna, do partido Rede, diz que é a favor da obra porque ela “faz a neutralização do carbono”. “O VLT é um transporte limpo e deve servir para Cuiabá durante 40 anos”, disse.
Em seu Plano de Governo, o candidato Julier Sebastião (PDT) critica o governo do Estado. “Para que a passagem do transporte coletivo em Cuiabá seja a menor, como propomos, a conclusão do VLT é essencial. Estamos com uma cruz afetando 75% das principais vias da cidade. O atual governo foi eleito dizendo que cumpriria esse modal. Quase dois anos se passaram e o cuiabano continua submetido a esse caos. A prefeitura precisa ter voz ativa. Vamos defender a implantação do VLT na sua totalidade”, escreveu.
O mesmo tom é utilizado pelo candidato Procurador Mauro (Psol): “Parece que o atual governo estadual não quer terminar a obra, que é de sua total responsabilidade. Nós faremos essa cobrança”, garantiu.
Wilson Santos (PSDB) entende que a obra deve continuar em parceria entre governo do Estado e União. “Vamos apoiar a conclusão do VLT, já que é ilusão acreditar que o município possa terminar uma obra dessa envergadura”, disse.
Serys Slhessarenko (PRB) se diz contrária ao modal VLT, mas, uma vez que mais de R$ 1 bilhão já foram investidos na obra, ela deve ser terminada. “O VLT deve ser parte de um sistema integrado de transporte coletivo. Se eleita, implementarei linhas de BRT (Bus Rapid Transit) para abastecer o sistema do VLT”, diz a candidata.
MOBILIDADE URBANA
Serys se diz especialmente preocupada com a violência do trânsito cuiabano. “Cuiabá é uma das capitais campeãs em acidentes de trânsito”, diz.
Para ela, a reestruturação completa do sistema de transporte coletivo deve ser um incentivo para que mais pessoas deixem carros e motos em casa, diminuindo a pressão sobre as vias e o estresse no trânsito.
A candidata acredita também que é dever do poder público levar obras de infraestrutura, de saúde e de escolas, além de incentivar a abertura de empresas como farmácias, mercados e bancos nos bairros periféricos, de modo a evitar que a pessoa que mora nessas localidades seja obrigada a frequentar o Centro diariamente.
Como parte dessa estratégia, Serys promete ainda concluir a obra do Rodoanel. “Quero realizar um grande replanejamento de mobilidade urbana em Cuiabá”, diz.
Wilson Santos, por sua vez, promete recapear 300 quilômetros de ruas e asfaltar outros 350 quilômetros, continuando a estratégia implantada pelo atual prefeito, Mauro Mendes. “A prefeitura tem feito um bom trabalho de adequações de vias, implantação de faixas elevadas e de redutores de velocidade. Vamos continuar esse trabalho”, disse.
“Além disso, pretendo implantar novas ciclovias e ciclofaixas, organizar as vias da rede urbana de forma articulada, promover estudos de implantação das vias estruturais circular Norte (Via Parque do Barbado), circular Sul 10, interligando Santa Terezinha às vias estruturais existentes, e da via estrutural Parque Córrego Gumitá”, completou.
Em seu Plano de Governo apresentado ao TRE, Procurador Mauro não fala em obras ou ações específicas. “Verificamos que a mercantilização do transporte público, com altos preços e baixa qualidade, somente tem permitido a privatização completa do espaço urbano. Este modelo de transporte é poluente, antidemocrático e impede sistematicamente o acesso de todas as pessoas à cidade. Todos os direitos sociais, como saúde, lazer, educação e esporte passam pelo direito essencial de ir e vir”, afirma.
“Propomos uma política que realmente interprete a mobilidade urbana como um direito e não uma mercadoria. Auditaremos e fiscalizaremos os termos contratados nas terceirizações, revisaremos as concessões e criaremos autarquias e empresas estatais municipais para execução direta dos serviços concedidos. Mudaremos a atual postura do município que, com o intuito meramente arrecadatório, tem gerado uma indústria da multa”, garante o candidato do Psol.
Assim como Serys, Julier Sebastião promete “construir uma Nova Proposta Integrada de Mobilidade Urbana para toda a cidade, de forma democrática, onde trânsito e transporte dos diferentes modais fazem parte”, afirma.
O candidato do PDT relaciona, como suas principais propostas, “constituir a Companhia Cuiabana de Transporte Público Municipal “TransCuiabá”, vinculada à Semob, construir novos corredores e faixas exclusivas para ônibus, ampliar e melhorar os pontos de táxi, criação um programa de recuperação das calçadas, reduzir a velocidade máxima nas vias arteriais, implantar semáforo para pedestres em todos os cruzamentos de maior fluxo e promover ações de educação no trânsito”.
Renato Santanna é outro que não diz que ações vai implementar para a mobilidade urbana caso seja eleito prefeito. Sua única preocupação exposta no plano de governo de apenas quatro páginas é com a poluição ambiental.
“Queremos uma mobilidade urbana que emita o mínimo de carbono, preservando assim o meio ambiente e que tenha infraestrutura para a mobilidade não-motorizada”, diz o documento protocolado no TRE.
Emanuel Pinheiro coloca fé no VLT para transformar toda a mobilidade urbana em Cuiabá. A expectativa, segundo Emanuel, é de que, com a circulação do VLT, haja menos veículos nas ruas e por consequência uma melhoria significativa no fluxo do trânsito e na qualidade de vida das pessoas.
“O número gigantesco de carros nas ruas de Cuiabá demonstra a insatisfação da população com o transporte público. Com a chegada do VLT, que é um transporte moderno e rápido, aliado a uma tarifa justa, o cuiabano migrará para o modal e com isso teremos menos carros nas ruas e um trânsito eficaz para a população cuiabana” afirmou.
TARIFA ZERO
Se a tarefa é chegar à prefeitura, as propostas mais esdrúxulas e ou inexequíveis podem chegar aos ouvidos dos eleitores, não sem motivo, cada vez mais alheios aos debates e programas no rádio e na TV.
Representante do partido mais à esquerda no espectro político brasileiro, Procurador Mauro (Psol) pretende, se eleito, municipalizar o serviço de transporte coletivo em Cuiabá e reduzir gradativamente a tarifa, até chegar a zero. Antes disso, estudantes e desempregados podem andar de graça. Em seu “Plano de Governo”, ele só não explica de onde tiraria o dinheiro para financiar essas benesses.
Na mesma linha, Emanuel Pinheiro (PMDB) propõe criar estacionamentos subterrâneos nas praças da República e Alencastro.
“O centro de Cuiabá está descaracterizado. O Centro Histórico não respeita o pedestre, não respeita o usuário, está desordenado e há uma péssima ocupação do espaço público. Então, numa reanálise da lei de uso e ocupação do solo, vamos humanizar o Centro e devolvê-lo à população com esse mote, com a vinda do VLT. Inclusive, está no nosso projeto a construção de estacionamentos subterrâneos na Praça da República e na Praça Alencastro”, afirmou Emanuel, em entrevista ao site Olhar Direto.
Ainda na linha de baixar a tarifa e oferecer mais benefícios sem dizer de onde virão os recursos, Julier Sebastião (PDT) diz vai “trabalhar com muito afinco para garantir que a tarifa do transporte público de Cuiabá seja a mais barata de todas as capitais do país”.
Julier promete realizar estudos para possível viabilização do Sistema de Transporte Municipal durante as 24 horas do dia; garantir que 100% da frota tenha acesso grátis à internet; criar a Companhia Cuiabana de Transporte Público Municipal, a “TransCuiabá”; construir novos corredores e faixas exclusivas para ônibus; e renovar 100% da frota, com todos os carros com ar-condicionado, aumentar as linhas de ônibus para os bairros mais populosos e distantes; adotar o Bilhete Único Diário, Semanal e Mensal, “que permitirá que o usuário realize tantas viagens quantas deseje”; e promover o “domingo livre”, com passagem gratuita.
Bem mais pé no chão, Wilson Santos (PSDB) diz que “ninguém vai transformar o transporte público de Cuiabá em um serviço de primeiro mundo”.
Ainda assim, ele promete ampliar a frota de ônibus, com veículos modernos com ar-condicionado, wifi e recursos de acessibilidade; renovar a frota para garantir que a idade média de ônibus seja de 5,5 anos; implantar tarifa social nos finais de semana e feriados; ampliar os abrigos de ônibus; reformar e adequar os terminais de ônibus; e implantar novos terminais.
Serys Slhessarenko (PRB) também pretende criar uma empresa pública de transporte urbano, “para operar as linhas deficitárias, como medida de desoneração e consequente redução da tarifa”, diz seu Plano de Governo.
A candidata promete, ainda: formar consórcio entre as empresas particulares de transporte urbano como meio de otimizar recursos e despesas, evitando a duplicação de operação de linhas; manter as atuais e criar novas faixas exclusivas de ônibus, melhorar o transporte alternativo e implantar o BRT.
Ainda em dúvida sobre o que é melhor para Cuiabá, Renato Santanna (Rede) diz que, se eleito, vai consultar a população para saber se ela prefere um transporte público ou privado. ”Talvez tenhamos que mudar a forma de concessão”, diz.