Tenente acusada de torturar e matar aluno diz que “ele não estava preparado para ser bombeiro”

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A tenente do Corpo de Bombeiros, Izadora Ledur de Souza Dechamps, acusada pela morte do aluno Rodrigo Patrício Lima Claro, de 21 anos, afirmou nesta quinta-feira (12), em audiência na Vara Criminal da Justiça Militar de Cuiabá, que a vítima tinha “descontrole emocional na água e não estava preparado para ser bombeiro”.

Devido a isso, segundo ela, participou de dois exercícios com Rodrigo.

O primeiro é conhecido como “caldo”, que é “colocar aluno em treinamento para saber agir quando uma vítima agarra durante o salvamento”. Ledur afirmou que segurava pela camiseta, segurava a boia e nadava sentido contrário.

O segundo exercício aplicado no aluno, segundo ela, foi o “nado resistido”.

“Ele sabia nadar, mas apresentava descontrole emocional com a água. O nado resistido aplicado ao aluno Claro era pra ver a resposta dele como evolução”, disse ela.

Ainda de acordo com a tenente, jogar água no rosto e submersão fazem parte do treinamento.

Rodrigo Claro morreu em novembro de 2016 

Ledur disse que o primeiro exercício de deslocamento na água no dia do treinamento na lagoa foi de ambientação. Os alunos participavam em dupla.

O percurso, segundo ela, era de 250 metros em 24 minutos, totalizando 500 metros a nado.

O curso teria sido o segundo aplicado por ela. Ledur garante que não aconteceu nada diferente nesse curso em relação ao anterior. “A diferença é a resposta do aluno”, diz.

Segundo ela, alunos que não atingiam padrão mínimo eram testados na água com o medo resistido.

Ela também afirmou ao juiz que “ele não era o pior aluno, outros tinham mais dificuldade”.

Ao juiz, ela negou ter presenciado Rodrigo passando mal, vomitando e não viu ele cair no chão como alguns colegas disseram.

Ela negou que houvesse perseguição e nem era aplicada nenhum tipo de punição.

A denúncia 

Segundo denúncia do Ministério Público Estadual (MPE), a tenente Izadora Ledur de Souza Dechamps, que era a instrutora do curso, usou de meios abusivos de natureza física e de natureza mental. A Justiça investiga se houve abusos por parte dos instrutores do curso de formação.

A morte de Rodrigo

Rodrigo Claro morreu em 2016 — Foto: TVCA/Reprodução

Rodrigo Claro morreu em 2016 — Foto: TVCA/Reprodução

Rodrigo morreu no dia 15 de novembro de 2016, cinco dias após passar mal em uma aula prática na Lagoa Trevisan, em Cuiabá, na qual a tenente Izadora Ledur atuava como instrutora.

De acordo com a denúncia do Ministério Público Estadual (MPE), Rodrigo demonstrou dificuldades para desenvolver atividades como flutuação, nado livre e outros exercícios.

Ainda segundo o órgão, depoimentos durante a investigação apontam que ele foi submetido a intenso sofrimento físico e mental com uso de violência. A atitude, segundo o MPE, teria sido a forma utilizada pela tenente para punir o aluno pelo mal desempenho.

Durante a realização das aulas, Rodrigo queixou-se de dor de cabeça. Após a travessia a nado na lagoa, ele informou ao instrutor que não conseguiria terminar a aula.

Em seguida, segundo os bombeiros, ele foi liberado, retornou ao batalhão e se apresentou à coordenação do curso para relatar o problema de saúde. O jovem foi encaminhado a uma unidade de saúde e sofreu convulsões.

Izadora Ledur era instrutora de curso dos bombeiros em Cuiabá (Foto: Câmara Municipal de Barra do Garças)

Mensagem à mãe

Em mensagem enviada para a mãe, Rodrigo disse que estava com medo — Foto: Reprodução/TVCA

Em mensagem enviada para a mãe, Rodrigo disse que estava com medo — Foto: Reprodução/TVCA

Antes do treinamento, o jovem conversou com a mãe dele por um aplicativo de conversas e disse que estava com medo do que poderia acontecer.

“A tenente está pegando no meu pé. Hoje ela vai ta lá, por isso fico com medo”, diz trecho da conversa.

Horas depois, Rodrigo voltou a falar com a mãe e mandou a última mensagem antes de ser internado em coma.

“Não consegui. Estou mal. Vou para a coordenação”, diz mensagem.

Tenente Ledur

Izadora Ledur de Souza Dechamps — Foto: Tiago Terciotty/TVCA

Izadora Ledur de Souza Dechamps — Foto: Tiago Terciotty/TVCA

A tenente responde criminalmente pela morte do aluno e ficou monitorada por tornozeleira eletrônica por três meses. No entanto, em outubro de 2017, conseguiu na Justiça o direito de retirar o equipamento.

A denúncia do MPE, diz que Ledur utilizou meios impróprios durante o treinamento com o aluno como “caldos” e afogamentos. Além disso, ela teria ameaçado desligar Rodrigo do curso.

No dia 3 de novembro do ano passado, duas testemunhas de defesa de Ledur, foram ouvidas pelo juiz da Vara Criminal da Justiça Militar Marcos Faleiros.

A primeira testemunha ouvida foi o médico legista Dionísio Andreoni, que assinou o laudo que atesta que um Acidente Vascular Cerebral (AVC) foi a causa da morte de Rodrigo.

O médico disse que é provável que Rodrigo já tivesse má formação no cérebro, o que teria causado o AVC.

Em contrapartida, a mãe de Rodrigo, Jane Claro, afirmou que o filho era saudável e nenhum exame anterior detectou a má formação.

Também foi ouvido durante a audiência o capitão do Corpo de Bombeiros Janislei Teodoro Silva. Ele foi comandante de pelotão da turma anterior à de Rodrigo onde um aluno desistiu do curso alegando abuso nos treinamentos comandados pela tenente Ledur.

O capitão afirmou durante o depoimento que nunca presenciou práticas abusivas por parte da tenente.